Page 22 - Jornal Labor News Versão Digital
P. 22
Opinião
Candida auris: emergência global
Giannina Ricci, PhD - Consultora em Biologia Molecular
Doutorado (CAPES/DAAD) Instituto de Medicina Tropical, Universidade de Tübingen, Alemanha e Depto. de Patologia/UNIFESP.
Pós-doutorado: Disciplina de Infectologia, Departamento de Medicina – LEMI/UNIFESP.
Centro de Pesquisa em Biologia Molecular Dr. Ivo Ricci
info@biomolricci.com
biomolricci23@gmail.com
Aproximadamente, 200 espécies fazem parte do gênero Candida, que Candida spp. nos laboratórios de análises clínicas, a maioria deles faz uso
é considerado um dos mais importantes na área médica, uma vez que as de sistemas comerciais de caracterização bioquímica, que são incapazes de
espécies Candida albicans, C. glabrata, C. parapsilosis, C. dubliniensis, reconhecer adequadamente e na maioria dos laboratórios, a identificação, em
C. tropicalis e C. krusei são importantes causas de Infecção Fúngica geral, chega somente ao gênero. MALDI-TOF apesar de ser uma tecnologia
Invasiva (IFI) no mundo. sofisticada, seu uso ainda está limitado porque nem todos os bancos de dados de
Candida auris, a mais nova espécie capaz de causar grave IFI, foi descrita referência incluídos nos dispositivos permitem a identificação. Uma alternativa
pela primeira vez em 2009 em amostra isolada do canal auditivo externo de mais acessível é a aplicação dos métodos moleculares a partir de técnicas de
um paciente com otite em um hospital japonês. A partir de então esse fungo detecção de DNA, como a PCR, PCR multiplex e qPCR (PCR em Tempo Real);
foi descrito, simultaneamente, nos cinco continentes, exceto na Antártida. No 2) Multirresistência: Candida auris constitui a única espécie fúngica capaz
Brasil, em 2017 a Anvisa publicou o primeiro boletim como Comunicado de de ser intrinsecamente resistente aos três principais antifúngicos utilizados
Risco Nº 01/2017 – GVIMS/GGTES/ANVISA em que “definiu a Rede Nacional na prática médica: os Azólicos, Anfotericina B e as Equinocandinas; 3) Alta
para identificação de C. auris em serviços de saúde e detalhou orientações para transmissibilidade e capacidade de colonização: a disseminação de C.
a vigilância laboratorial, encaminhamento de isolados para laboratórios de auris entre pacientes é amplamente facilitada por sua capacidade de persistir
referência e as medidas de prevenção e controle de Infecções Relacionadas à em formas viáveis no ambiente por longos períodos de tempo. De acordo
Assistência à Saúde (IRAS) causadas por Candida auris.” Novos boletins (**) com estudos, leveduras viáveis foram recuperadas de superfícies de quartos
foram emitidos posteriormente e até o momento foram registrados surtos em e banheiros do ambiente hospitalar, como colchões, travesseiros, lençóis,
Salvador (15 casos e 2 óbitos), Recife (47 casos e continua em monitoramento) mesas, pias, vasos sanitários, paredes, maçanetas e torneiras, além de material
e Campinas (1 caso). sanitário, como sondas de temperatura, manguitos para medida da pressão
Um dado interessante, que vale mencionar, ocorreu durante a pandemia de arterial, ventiladores mecânicos, máscaras de oxigênio e dispositivos pessoais,
SARS-CoV-2, nesse período observou-se que o uso de equipamentos de proteção como telefones celulares. Além disso, é capaz de sobreviver em superfícies
individual (EPI) não evitou a transmissão de C. auris, uma vez que foram abióticas não porosas, como plástico ou aço, por até 28 dias.
verificados vários surtos de COVID-19 em unidades de tratamento, bem como A taxa de mortalidade da candidemia gira em torno de 30% e 60%, enquanto
nas enfermarias convencionais. Importante destacar que a pandemia de SARS- àquela observada em infecções apenas por C. auris varia de 30% a mais de 70%.
CoV-2 criou uma atmosfera ideal para a disseminação desse fungo em função À vista disso, o diagnóstico preciso e precoce é fundamental para que a terapia
dos seguintes fatores: saturação hospitalar; facilidade de transmissão nosocomial; seja iniciada rapidamente.
capacidade de colonizar facilmente nesse tipo de ambiente e a diminuição da
eficácia dos sistemas de prevenção microbiológica. *Parte do texto foi extraída e traduzida livremente do artigo “What Do We
Por que Candida auris tem sido denominado como “superfungo”? Know about Candida auris? State of the Art, Knowledge Gaps, and Future
Basicamente, três fatores o tornam ameaçador e alarmante: 1) Dificuldade Directions” de Garcia-Bustos, et col.
no diagnóstico: apesar de existirem vários métodos para identificação de ** As referências serão enviadas, quando solicitadas.
A RDC 786 no centro das discussões da CBAC
Josely Chiarella
Farmacêutica-Bioquímica, Diretora técnica - CBDL
Câmara Brasileira de Diagnóstico Laboratorial
cbdl@cbdl.org.br realizados testes de triagem, sem fins confirmatórios, que possam ser integrados
às ações de assistência farmacêutica, assistência à saúde e orientação sanitária.
É recomendado que os laudos incluam a frase de alerta: “Este procedimento não
O 48º Congresso da Sociedade Brasileira de Análises Clínicas (CBAC) foi tem finalidade diagnóstico e não substitui a consulta médica”.
realizado em Florianópolis, entre os dias 18 e 21 de junho, com grande presença O evento contou com a presença de Giselle Calais, gerente geral de Tecnologia
de profissionais e empresas do setor. A mediação foi de Maria Elizabeth Menezes, em Saúde da ANVISA, que esclareceu diversos aspectos relacionados aos
presidente da SBAC. Roteiros de Inspeções preparados pelo órgão. Com essas orientações os fiscais
Um dos temas mais discutidos foi a recém-publicada RDC 786/2023, que trata locais vão poder realizar as inspeções de forma homogênea por todo o país.
dos requisitos técnicos-sanitários para o funcionamento de laboratórios clínicos Em uma outra sessão com a presença de cerca de 350 pessoas, o Dr. Alex
e outros serviços em ambientes diversificados como farmácias e consultórios Machado Campos, diretor de 3ª diretoria da ANVISA, debateu longamente com
isolado, agora chamados de Serviços tipo I. Isso vai ampliar o acesso aos testes representantes de diversas entidades. Também participaram o Prof. Dr. Pedro
diagnósticos pela população. Essa resolução inovadora vai substituir a RDC Eduardo Almeida da Silva, diretor do Departamento de Articulação Estratégica de
302/2005 e entrará em vigor no dia 01 de agosto de 2023 Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde, Dr Luís Fernando Barcelos, diretor
Em mais várias sessões de debates, os profissionais presentes puderam executivo da SBAC, Dra. Lenira da Silva Costa, vice-Presidente do Conselho
tirar várias dúvidas. Por exemplo, a Controllab – Controle de Qualidade para Federal de Farmácia, Dr. Fabio Brazão, presidente da Sociedade Brasileira de
Laboratórios - coordenou um workshop que esclareceu os temas relacionados Patologia Clínica e Medicina Laboratorial (SBPC/ML), e Dr. Wilson Shcolnik,
à gestão da Qualidade Analítica sob a perspectiva da nova RDC. Agora, os presidente da Associação Brasileira de Medicina Diagnóstica (ABRAMED),
laboratórios de análises clínicas, os Serviços tipo III, serão os responsáveis e Carlos Eduardo Gouvea, presidente executivo da Câmara Brasileira de
pela implementação dos Programas de Qualidade em farmácias e consultórios, Diagnóstico Laboratorial (CBDL). Nesse debate foram abordadas questões
quando esses locais fizerem uso de instrumentos para leitura, interpretação ou ligadas ao processo de ingresso dos pacientes num serviço de saúde a partir de um
visualização dos resultados. teste de triagem positivo. Também foram apontadas preocupações com relação
Outro ponto bastante explorado nas discussões foram os testes que podem as inspeções fiscalizatórias que as Vigilâncias Sanitárias locais realizarão nas
ser realizados nos serviços tipo I. A resolução define claramente que podem ser farmácias que fizerem os testes.
22
22

