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Opinião


                                      Candida auris: emergência global


                        Giannina Ricci, PhD - Consultora em Biologia Molecular
                        Doutorado (CAPES/DAAD) Instituto de Medicina Tropical, Universidade de Tübingen, Alemanha e  Depto. de Patologia/UNIFESP.
                        Pós-doutorado: Disciplina de Infectologia, Departamento de Medicina – LEMI/UNIFESP.
                        Centro de Pesquisa em Biologia Molecular Dr. Ivo Ricci
                        info@biomolricci.com
                        biomolricci23@gmail.com

           Aproximadamente, 200 espécies fazem parte do gênero Candida, que   Candida  spp.  nos  laboratórios  de  análises  clínicas,  a  maioria  deles  faz  uso
        é considerado um dos mais importantes na área médica, uma vez que as   de sistemas comerciais de caracterização bioquímica, que são incapazes de
        espécies Candida albicans, C. glabrata, C. parapsilosis, C. dubliniensis,   reconhecer adequadamente e na maioria dos laboratórios, a identificação, em
        C. tropicalis e  C. krusei  são  importantes  causas  de  Infecção  Fúngica   geral, chega somente ao gênero. MALDI-TOF apesar de ser uma tecnologia
        Invasiva (IFI) no mundo.                                        sofisticada, seu uso ainda está limitado porque nem todos os bancos de dados de
           Candida auris, a mais nova espécie capaz de causar grave IFI, foi descrita   referência incluídos nos dispositivos permitem a identificação. Uma alternativa
        pela  primeira  vez em  2009 em  amostra isolada  do canal  auditivo  externo  de   mais acessível é a aplicação dos métodos moleculares a partir de técnicas de
        um  paciente  com  otite  em  um  hospital  japonês. A  partir  de  então  esse  fungo   detecção de DNA, como a PCR, PCR multiplex e qPCR (PCR em Tempo Real);
        foi descrito, simultaneamente, nos cinco continentes, exceto na Antártida. No   2) Multirresistência: Candida auris constitui a única espécie fúngica capaz
        Brasil, em 2017 a Anvisa publicou o primeiro boletim como Comunicado de   de  ser  intrinsecamente  resistente  aos  três  principais  antifúngicos  utilizados
        Risco Nº 01/2017 – GVIMS/GGTES/ANVISA em que “definiu a Rede Nacional   na prática médica: os Azólicos, Anfotericina B e as Equinocandinas; 3) Alta
        para identificação de C. auris em serviços de saúde e detalhou orientações para   transmissibilidade e capacidade de colonização:  a disseminação de  C.
        a vigilância  laboratorial,  encaminhamento  de isolados para laboratórios  de   auris entre pacientes é amplamente facilitada por sua capacidade de persistir
        referência e as medidas de prevenção e controle de Infecções Relacionadas à   em  formas  viáveis  no  ambiente  por  longos  períodos  de  tempo.  De  acordo
        Assistência à Saúde (IRAS) causadas por Candida auris.” Novos boletins (**)   com  estudos,  leveduras  viáveis  foram  recuperadas  de  superfícies  de  quartos
        foram  emitidos  posteriormente  e  até  o  momento  foram  registrados  surtos  em   e  banheiros  do ambiente  hospitalar,  como  colchões,  travesseiros,  lençóis,
        Salvador (15 casos e 2 óbitos), Recife (47 casos e continua em monitoramento)   mesas, pias, vasos sanitários, paredes, maçanetas e torneiras, além de material
        e Campinas (1 caso).                                            sanitário, como sondas de temperatura, manguitos para medida da pressão
           Um dado interessante, que vale mencionar, ocorreu durante a pandemia de   arterial, ventiladores mecânicos, máscaras de oxigênio e dispositivos pessoais,
        SARS-CoV-2, nesse período observou-se que o uso de equipamentos de proteção   como  telefones  celulares. Além  disso,  é  capaz  de  sobreviver  em  superfícies
        individual  (EPI)  não  evitou  a  transmissão  de  C. auris,  uma  vez  que  foram   abióticas não porosas, como plástico ou aço, por até 28 dias.
        verificados vários surtos de COVID-19 em unidades de tratamento, bem como   A taxa de mortalidade da candidemia gira em torno de 30% e 60%, enquanto
        nas enfermarias convencionais. Importante destacar que a pandemia de SARS-  àquela observada em infecções apenas por C. auris varia de 30% a mais de 70%.
        CoV-2 criou uma atmosfera ideal para a disseminação desse fungo em função   À vista disso, o diagnóstico preciso e precoce é fundamental para que a terapia
        dos seguintes fatores: saturação hospitalar; facilidade de transmissão nosocomial;   seja iniciada rapidamente.
        capacidade de colonizar facilmente nesse tipo de ambiente e a diminuição da
        eficácia dos sistemas de prevenção microbiológica.                 *Parte do texto foi extraída e traduzida livremente do artigo “What Do We
           Por que Candida auris tem sido denominado como “superfungo”?  Know about Candida auris? State of the Art, Knowledge Gaps, and Future
           Basicamente, três fatores o tornam ameaçador e alarmante: 1) Dificuldade   Directions” de Garcia-Bustos, et col.
        no  diagnóstico:  apesar  de  existirem  vários  métodos  para  identificação  de   ** As referências serão enviadas, quando solicitadas.


                           A RDC 786 no centro das discussões da CBAC



                          Josely Chiarella
                          Farmacêutica-Bioquímica, Diretora técnica - CBDL
                          Câmara Brasileira de Diagnóstico Laboratorial

                          cbdl@cbdl.org.br                              realizados testes de triagem, sem fins confirmatórios, que possam ser integrados
                                                                        às ações de assistência farmacêutica, assistência à saúde e orientação sanitária.
                                                                        É recomendado que os laudos incluam a frase de alerta: “Este procedimento não
           O 48º Congresso da Sociedade Brasileira de Análises Clínicas (CBAC) foi   tem finalidade diagnóstico e não substitui a consulta médica”.
        realizado em Florianópolis, entre os dias 18 e 21 de junho, com grande presença   O evento contou com a presença de Giselle Calais, gerente geral de Tecnologia
        de profissionais e empresas do setor. A mediação foi de Maria Elizabeth Menezes,   em  Saúde da  ANVISA, que esclareceu  diversos aspectos  relacionados  aos
        presidente da SBAC.                                             Roteiros de Inspeções preparados pelo órgão. Com essas orientações os fiscais
           Um dos temas mais discutidos foi a recém-publicada RDC 786/2023, que trata   locais vão poder realizar as inspeções de forma homogênea por todo o país.
        dos requisitos técnicos-sanitários para o funcionamento de laboratórios clínicos   Em uma outra sessão com a presença de cerca de 350 pessoas, o Dr. Alex
        e  outros  serviços  em  ambientes  diversificados  como  farmácias  e  consultórios   Machado Campos, diretor de 3ª diretoria da ANVISA, debateu longamente com
        isolado, agora chamados de Serviços tipo I. Isso vai ampliar o acesso aos testes   representantes  de  diversas  entidades. Também  participaram  o  Prof.  Dr.  Pedro
        diagnósticos  pela  população.  Essa  resolução  inovadora  vai  substituir  a  RDC   Eduardo Almeida da Silva, diretor do Departamento de Articulação Estratégica de
        302/2005 e entrará em vigor no dia 01 de agosto de 2023         Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde, Dr Luís Fernando Barcelos, diretor
           Em  mais  várias  sessões  de  debates,  os  profissionais  presentes  puderam   executivo da SBAC, Dra. Lenira da Silva Costa, vice-Presidente do Conselho
        tirar várias dúvidas. Por exemplo, a Controllab – Controle de Qualidade para   Federal de Farmácia, Dr. Fabio Brazão, presidente da Sociedade Brasileira de
        Laboratórios - coordenou um workshop que esclareceu os temas relacionados   Patologia Clínica e Medicina Laboratorial (SBPC/ML), e Dr. Wilson Shcolnik,
        à  gestão  da  Qualidade Analítica  sob  a  perspectiva  da  nova  RDC. Agora,  os   presidente  da  Associação  Brasileira  de  Medicina  Diagnóstica  (ABRAMED),
        laboratórios  de análises  clínicas, os Serviços tipo  III, serão os responsáveis   e  Carlos  Eduardo  Gouvea,  presidente  executivo  da  Câmara  Brasileira  de
        pela implementação dos Programas de Qualidade em farmácias e consultórios,   Diagnóstico  Laboratorial  (CBDL).    Nesse  debate  foram  abordadas  questões
        quando esses locais fizerem uso de instrumentos para leitura, interpretação ou   ligadas ao processo de ingresso dos pacientes num serviço de saúde a partir de um
        visualização dos resultados.                                    teste de triagem positivo. Também foram apontadas preocupações com relação
           Outro ponto bastante explorado nas discussões foram os testes que podem   as  inspeções  fiscalizatórias  que  as Vigilâncias  Sanitárias  locais  realizarão  nas
        ser realizados nos serviços tipo I. A resolução define claramente que podem ser   farmácias que fizerem os testes.

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